Do novo livro de Nuno Ramos, O Mau Vidraceiro, ed. Globo:
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Frutas
Depois de falar longamente a meu respeito, perguntei, E você, o que você tem feito?, como se fosse impossível que pensasse mal de mim depois dessa pergunta cuidadosa. Nada, ele me disse, e, diante do meu silêncio, acrescentou, Tenho comido frutas.
Depois de falar longamente a meu respeito, perguntei, E você, o que você tem feito?, como se fosse impossível que pensasse mal de mim depois dessa pergunta cuidadosa. Nada, ele me disse, e, diante do meu silêncio, acrescentou, Tenho comido frutas.
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O deus leitor
Abram os jornais. Mergulhem nas notícias Afoguem-se com o vendaval no Oriente. Explodam com o homem-bomba no deserto do Sinai. Lugares, nomes de lugares. Gente, nome de gente. Notícias, cheiro de tinta. Tudo é tão confortável. Mas quem poderia compreender o que está escrito a ponto de padecer fisicamente, ferindo seu corpo e sangrando com aquilo que lê, durante o ato mesmo de ler? Um novo deus leitor, pregado na cruz do que está escrito. Este mostraria quanto vale uma palavra.
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Em O Mau Vidraceiro todas as curtas narrativas e palavras, mesmo que densas, fluem leves, rápidas, soltas e livres. Imaginação livre.
O artista plástico Nuno Ramos elabora obras literalmente pesadas; sua escrita voa. Técnica mista.
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