sábado, 18 de setembro de 2010

Livro


A Terra está sendo assolada por uma temível onda de calor. Um carioca octagenário quer assistir ao desmanche das calotas polares. Seu nome é Senhor R. Ele planeja uma visita ao Ártico como quem prepara uma despedida amorosa. Seu destino é a Groenlândia e suas futuras verdes planícies. Um horizonte que o Senhor R. não poderá desfrutar. O seu tempo morre com ele.

O Senhor R. não é um velho qualquer, ele é o novo velho, desses que experimentaram de tudo, que contribuíram para revolução de costumes, assistiram à criação do cinema, enlouqueceram ao som das guitarras elétricas, emudeceram diante do assombro da bomba e acreditaram na promessa da eterna juventude. O Senhor R. é o século XX e seu humanismo em extinção.

Nessa viagem, o Senhor R. levará outros dois jovens velhos com ele. Velhos como os que nos tornaremos um dia, do tipo que ainda vive paixões, sente ciúme e se impressiona com o deslumbrante entardecer do verão de Ipanema. Em apenas um par de décadas esses velhos serão a maioria da população no planeta . Esses velhos somos nós.

Assim como no apagar da Idade Média, gastamos, hoje, grande parte dos nossos curtos dias em previsões catastróficas e premunições funestas a respeito do fim da humanidade. Muitas vezes, temos a impressão de que não vale a pena fazer parte de um mundo vil e muito menos de enfrentar as atribulações da velhice, com suas gotas, dores reumáticas e doenças degenerativas. O Senhor R. é a contramão desse sentimento; uma injeção de aventura, coragem, delicadeza, humor, amor, sexo e generosidade.

Fernanda Torres